domingo, 4 de abril de 2010

Cidade funcional deve ter múltiplos centros, diz senador francês

Mais um exemplo de que investimento dispersão estratégicas de centros multiplos, investimento em transporte público e moradia social devem ser inseridos em um contexto de pensamento coletivo de cidade para realmente proporcionar qualidade de vida para os cidadãos. Essa entrevista foi realizada com um politico (senador) francês durante sua visita ao World Urban Forum 5.


  

São Paulo, domingo, 28 de março de 2010
Claudia Antunes da Sucursal do Rio 
Especialista Yves Dauge afirma que transporte sobre trilho e bairros multifuncionais são segredo para metrópoles integradas socialmente

Para ex-diretor de Urbanismo da França, cidades planejadas dependem de corrida entre vontades política e privada e os assentamentos irregulares

Transportes sobre trilhos, bairros multifuncionais e múltiplos centros são o segredo de uma cidade funcional e integrada socialmente, diz o senador socialista Yves Dauge, que chefiou a delegação da França no 5º Fórum Mundial Urbano, encerrado na sexta no Rio.

Dauge, 75, foi diretor de Urbanismo do Ministério da Infraestrutura durante a Presidência de François Mitterrand (1981-1995), quando coordenou as "grandes obras", que incluem a pirâmide do Louvre.

Promotor de lei que prevê que toda cidade francesa deve ter pelo menos 20% de moradias sociais, Dauge diz que, para uma cidade planejada, a vontade política tem que travar uma "corrida incessante" com os investimentos privados e os loteamentos irregulares. Abaixo, trechos da entrevista à Folha.

FOLHA - Vemos uma competição entre países para ver quem faz o prédio mais alto, mais inusitado. Há uma dicotomia entre grandes obras e uma cidade menos segregada?
YVES DAUGE - É falsa a ideia de que, quanto mais rica a cidade, mais os pobres serão bem tratados. Há mais do que dicotomia, há uma contradição. A cidade deve ser integrada social e territorialmente. Mas é preciso uma força política enorme para se chegar a isso.

FOLHA - As grandes cidades brasileiras têm má integração viária entre a periferia e o centro. Como lidar com isso?
DAUGE - Com um sistema de transporte coletivo e com o conceito de multicentros. Sempre há um centro maior, em geral ligado à história da cidade. Mas os grandes aglomerados urbanos têm que ter múltiplos centros. Para isso, é preciso investimento intelectual e uma corrida incessante entre a vontade política e os investidores privados, os especuladores e os assentamentos irregulares, que não esperam.

FOLHA - Como contornar os efeitos sobre a ocupação territorial das disparidades de renda?
DAUGE - Com uma abordagem fiscal. É possível redistribuir a renda dos impostos dos bairros que produzem muita riqueza para os mais pobres. Na França, criamos o Imposto de Solidariedade Urbana.

FOLHA - Como convencer os que devem pagar mais dos benefícios que poderão ter?
DAUGE - É papel do político. A desigualdade não vai ser revertida naturalmente, e as ilhas de riqueza não podem sobreviver num mundo que se revoltará contra elas.

FOLHA - O senhor pode apontar na França exemplos positivos de cidades integradas?
DAUGE - Nantes, por exemplo, é cercada a leste e ao norte por bairros e subúrbios com muitas moradias sociais.

FOLHA - Neste ano, completam-se cinco anos da revolta de jovens desempregados nas periferias das grandes cidades francesas. O problema foi sanado?
DAUGE - Essa questão tem uma dimensão urbanística, mas é sobretudo ligada à imigração, e portanto à colonização, que deixou uma marca nos dois lados. Essa história pode se diluir, mas ela não terminou. Quando o Partido Socialista estava no poder, tentou criar uma polícia de proximidade nos subúrbios. A direita acabou com o projeto. Sempre é possível demolir os conjuntos residenciais, e dar uma pequena casa a cada um, como a direita já propôs. Mas isso é uma utopia total, porque a cidade não é a acumulação de casas individuais, mas um projeto coletivo. Entramos numa espiral perigosa, e precisamos recriar os laços, para restaurar a confiança que acabou.

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